YORUBÁS - DAS LENDAS À REALIDADE

IFÉ, BENIN, OYÓ E IGBÔ - CENTROS YORUBÁS
Assim como os reinos bantus, os reinos yorubás foram igualmente submetidos a intensas relações comerciais com os invasores europeus, num primeiro momento espontâneas até que, gradativamente, as coisas tomariam proporções fora do controle, e para o benefício dos europeus, os próprios yorubás se destruiriam pouco a pouco até o fim pela via bélica proporcionada pela marinha inglesa. De portugueses, holandeses, ingleses e franceses aos soberanos yorubás, muitas relações se estabeleceram.
Desde sua fundação, Ilê-Ifé tem uma mística envolta de seu desenvolvimento. Provavelmente seu início a partir do século XI, tem partida na migração de povos de regiões distantes da iorubalândia e seu patrono seria o mítico Oduduwa, que unificou um diversificado grupo de pequenas cidades-Estados que viviam numa cultura baseada na agricultura, forjaria e trocas comerciais com outros reinos e até alguns contatos com as primeiras rotas de comércio árabes. Essa ocupação e centralização do poder não seria de toda simples e fácil, estima-se que outros povos já ocupavam a região, como explica a lenda em que Ifé domina parte dos Igbô, reino importante constituído também de alguns Estados.
Oduduwa teria enviado seus filhos, os príncipes da linhagem real para outras regiões, e estes deveriam mover tropas em missões bélicas ou diplomáticas. Regiões como Owu, Ketu, Ilá, Sabé, Benin, Popa e uma das mais importantes: Oyó, foram dominadas ou articuladas e submetidas à dinastia de Oduduwa.
Como consta, Oranyan, um dos príncipes mais importantes e que se tornaria um dos grandes Obás ( soberanos ) entre os yorubás, teria dominado Benin à pedido dos antigos chefes do Benin, conhecidos como uzama. Oduduwa teria enviado Oranyan e com a relação entre a dinastia yorubá e a dinastia edo, surgiria ali, em meados de 1300, uma espécie de vassalagem, onde Ifé submetia Benin a pagamentos de tributos e trocas de itens variados. Porém, Oranyan não se fazia de todo presente em Benin, estando a maior parte do tempo em Ifé, e isso fez ascender um sentimento de autonomia nos povos Edo do Benin, nesse contexto, irá surgir o soberano Ewuare, que mudou radicalmente o poder dos uzama, conta-se que era um líder muito carismático e facilmente conquistou vários membros dos Estados Edo á volta de Benin e formou sua máquina de guerra, conquistando os mesmos Estados e chegando a exercer cobrança de tributos a Ijebú, um dos mais antigos Estados yorubás, o que fez com que as dinastias de Ifé recuassem diante do Benin que agora era uma potencial ameaça e um concorrente militar e comercial.
Em paralelo a isso, Oranyan funda o reino de Oyó, também mítico e pai de Xangô, que foi gerado de sua união com Torosí, filha de Elempê, soberano Nupê, e isso garantiu certa aproximação da recém formada Oyó aos Nupê já estabelecidos nas proximidades. Outro filho de Oranyan, Eweká teria subjugado Benin, possivelmente Ewuare não se encontrava no poder de Benin quando isso acontece.
Com o passar do tempo, Oyó se tornaria um grande centro militar, e Ifé se tornaria um centro religioso aos yorubás. Oyó se torna um império na medida em que vai subjugando outros Estados, como Ikoyi, Oyoko, Owô, Iwô e outros, caracterizando um forte caráter expansionista e conquistando vassalos. Os Ijexá que viviam em florestas e não em savanas como os de mais reinos conteram os avanços dos Oyó, muito por conta de que Oyó utilizava arqueiros e cavalarias e isso impediu o avanço em meio às matas, protegendo o reino dos Ijexá.
Os Oyó mantinham contatos com os Baribas, os Nupês e também os Haussás. Resultado dos contatos com os árabes, cavalos, armas e outras tecnologias passaram a ser adaptadas, vale lembrar que os yorubás num geral já manipulavam as técnicas de forjaria há séculos e isso era amplamente representado em suas artes com latão, bronze e na fabricação de espadas, escudos, armaduras e outros adereços. No século XIV o reino havia sido invadido pelos nupês. À essa altura a amizade com os nupês havia sido deteriorada, já que a expansão de Oyó não parou mais e guerras foram travadas. Em 1530 os Oyós foram expulsos de sua antiga capital, Ilê-Oyó, essa invasão nupê foi comandada pelo mítico líder Tsoede, que teria nascido em 1463, tornado escravo em Idah em 1493 e em 1523 fugiu e retornou a terras nupês, onde se tornaria um grande líder, subjugando Oyó em 1530-31. Tsoede teria falecido em 1591 e sim, ele viveu 128 anos, se tornando uma lenda.
Os Oyós só teriam retomado o controle em aproximadamente 80 anos depois! A dinastia teria se exilado entre os Baribas e sob mando de Obá-Ofinran, um grande exército mesclado contra-atacou e retomou o vasto território Oyó das mãos dos nupês, resultado desse episódio, o culto aos egungun seria incorporado aos Oyó, que a essa altura já cultuavam o terceiro rei de Oyó, Xangô, como deus do trovão.
Em paralelo a esses eventos, os Igbô iriam se desenvolvendo com técnicas de comércio baseadas na agricultura, também iriam dividir a forja. Igualmente ligado ao que é sacro, os Igbô iriam estabelecer relações religiosas muito fortes, e isso iria se atrelar às suas centralidades políticas, entretanto, Estados como Onitsha, Ogutá e Aboh iriam mesclar conceitos de Benin ao seu sistema, já que eram vizinhos e muito por conta de que os dissidentes desses Estados haviam migrado de regiões sob domínio Edo do Benin liderados pelo Obá Esigie ( aproximadamente 1517 - 1550 ) e tal movimento ocorreria por conta de conflitos e guerras, sublevações e tumultos de vassalos ao Benin, obrigando a fuga de grandes grupos. Esigie seria tido como um grande guerreiro, condecorado com honrarias e ainda consagrado à Olokun, o grande Orixá dos mistérios dos mares. O soberano militar também teria tido apoio português na batalha contra Igala, o que o ajudou a se fortalecer e aumentar seu prestígio na formação de Estados Igbô-Ikwu com características dos Edo.





YORUBÁS, MITO E REALIDADE
Os yorubás tinham muitos conflitos, muitos destes decorrentes de expansão, trocas comerciais e posteriormente ao século XV, o tráfico negreiro ganharia uma importância única no desenvolvimento e na queda destes reinos. Mas, mesmo se a partir do século IX os contatos com povos árabes e islamizados passaram a se iniciar, as tradições orais dos grandes líderes, dos deuses, dos filhos e irmãos de Ifá, o grande oráculo dos Orixás, ou se o próprio Oduduwa se tornaria um Orixá, bem como seus filhos seriam agraciados, como constam algumas lendas, tais como Ajaká, Ogum, Xangô. Ou ainda as andanças de Orixalá em seu exílio no pós-guerra entre Ifé e Igbô, os conselhos de Obatalá, a sabedoria de Nanã e seus sacerdotes e sacerdotisas peregrinando para manter seu culto desde tempos imemoriais sempre foi o que fortaleceu a cultura, identidade e pertencimento dos povos yorubás em geral.
Mesmo com a influência cristã, os conflitos cada vez maiores entre os Edo e Oyó, e ainda assim a mesclagem cultural e religiosa que desses conflitos surgiria com as lendas em torno de Xapanã, os mitos dos Egungun originários dos nupês e assim por diante, continuaram sendo as bases da vida e cultura desses povos que desde a milênios anteriores a Cristo, através de seus ancestrais Nok já externavam suas artes únicas e que ganhariam o mundo no choque cultural, religioso e sobretudo bélico com os europeus. Reinos como o de Benin, ou mercenários pertencentes aos Aro, que viviam entre os Igbô na busca, caça e guerras por espólios humanos que tornaram obscura a história desses povos, ainda que houvesse a tradição oral que conservasse a oposição de Oyó ao tráfico negreiro, quando numa expedição de Oyó para saudar os " visitantes " europeus contendo 800 membros jamais havia retornado, aumentando a desconfiança de Alaáfin´s desde então. Nada disso foi capaz de apagar a memória e sabedoria de ricos impérios e reinos de tempos de outrora que hoje circulam nas veias de África e também de América, o legado cultural que viajou pelos mares, pelos céus e hoje sobrevive na memória e no sangue de africanos e americanos pelo mundo.





Fontes e Indicações:
" Do Delta do Níger aos Camarões: os fon e os iorubá " - E.J.Alagoa , artigo compilado em: História Geral da África - Volume V - Séc. XVI ao XVIII - Editor: Bethwell Allan Ogot, 1964 - Edição 2011, Unesco
" Do Volta aos Camarões " - Allan Frederick Charles Ryder, artigo compilado em: História Geral da África - Volume IV - Séc. XII ao XVI - Editor: Djibril Tamsir Niane, 1964 - Edição 2011, Unesco
" Orixás, Deuses Iorubás na África e no mundo " - Pierre Fatumbi Verger, 1981 - Edição 2018, Fundação Pierre Verger



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