REINO DE ILÊ-IFÉ
Quando falamos em Yorubás, logo ligamos esse nome à religiosidade afro-brasileira, e não está errado. Os Yorubás se tornaram fundamentais aos cultos de matriz africana no Brasil, popularizando os Orixás como os conhecemos hoje, os misturando aos Nkisses que vieram dos Bantus e aos Voduns dos povos Jejes.
Para podermos falar desses três reinos compostos pelos povos Yorubás, temos que entender a íntima ligação com a religiosidade. A partir do Séc. XI, os iorubás começaram a se constituir como reinados, antes tribos independentes e passaram por uma unificação, o primeiro reino a surgir dessa unificação seria justamente o de Ilê-Ifé, antes uma cidade, agora sob o comando do Oní ( rei ), e dos Obás ( conselheiros do monarca ), o culto a Olorum ( deus ) foi centralizado lá, logo, a figura do Oní era ligada a deidade, e aos Orixás; o Reino de Ilê- Ifé tinha a cultura do ouro também, assim como a do marfim, além de peles. Não era um povo bélico, e sim muito religioso, estima-se que a cidade de Ilê-Ifé poderia ter começado a ser povoada em 500 a 450 a.C pelos Nok, uma importante civilização que durou até o século II d.C, eram agricultores mantendo o cultivo de inhame e também confeccionavam armas com o uso do metal, muito dessa cultura foi assimilada pelos iorubás, posteriormente, constituindo pequenos Estados, como Ifé.
Muito por conta da falta de documentação e a cultura da ancestralidade ser passada oralmente, o assentamento da cidade é rodeado de mitos e lendas e muito por isso, Ilê- Ifé era a capital sagrada dos povos iorubás de todos os reinos. Sua queda como Estado teocrático iorubano aconteceu no século XVI, com a invasão Hauçá na região, os hauçás eram um povo islamizado e de cultura bélica.
Hoje Ilê-Ifé se encontra no Estado de Osun, na Nigéria.
REINO DE OYÓ
Outro reino importante para os povos iorubás foi o de Oyó, que representava uma centralidade política forte, e durou desde o século XIV ao XIX, ou seja, o exército iorubá ficava, em sua maior contingência, em Oyó, possuíam cavalarias que, segundo informações, foi implementada pelo governador Orôpotó por volta de 1600, e utilizavam armas como lanças e espadas além de escudos. O regente de Oyó era conhecido como Alaáfin, que significa algo como " dono do palácio ", aqui cabe uma curiosidade: - Existe uma lenda em torno da fundação de Oyó, que estaria intimamente ligada ao Orixá Xangô, o Orixá da Justiça e do fogo, além disso, ainda teríamos outros reinos ligados à outros Orixás, como os de Irê, reino de Ogum, ou de Agelú, que foi herdado o trono pelo Orixá Exú ou Bará. Oranyan era filho de Odudúwa, o primeiro Obá de Ifé, e ordenou que o filho subjugasse povos ao norte de Ifé, tendo como objetivo puni-los por não respeitar o fundador de Ifé, a missão falha, Oranyan encontra um povo mais amigável e é orientado a seguir uma cobra até que ela parasse, ali teria o início ao Reino de Oyó. Posteriormente ao reinado de Oranyan, assume o trono Obá-Ajaká, este teria sido deposto e então assume seu irmão, Xangô, que reina até a morte e por ter sido justo e exemplar, se tornar então um Orixá. Ajaká reassume o trono e comanda com punhos de ferro, seu sucessor é Obá-Kori, que expande o território e funda a chamada " Oyó Metropolitana ".
Como citado, a fundação desses pequenos reinos é ligada, e fundamentalmente estreitada à religiosidade. Além disso, os povos iorubás também tinham uma agricultura forte e cultivo de algodão
O reino ainda foi invadido e saqueado em meados de 1530 pelos Nupês, incursão comandada por Tsoede, onde só quase um século depois, os Oyós começaram as incursões pela retomada do império, que acontece no século XVI. Muitos Alaáfins se envolveram nessa missão, porém, poucos dados se tem sobre eles que são: Onigboji, onde começa a derrocada pelos ataques nupês à capital de Oyó, no governo de Obá-Ofinran, os iorubás recuperam a capital das mãos dos Nupês, isso acontece 80 anos depois da primeira derrota. Depois da retomada, Obá-Egonoju conquistou quase toda a iorubalância ( reinados iorubás ), estabelecendo uma cultura expansionista, elevando o reino a Império.
Oyó teve uma guerra sangrenta que data de 1728 à 1748 contra o Reino do Dahomé ( Benin ) e atual país de Benin, o exército de Oyó sai vitorioso dessa guerra, porém enfraquecido. No século XVIII, o reino passou a ser invadido pelos Fulanis, um povo que também havia sido islamizado coincidindo com a invasão hauçá em Ilê-ifé. Alguns historiadores dizem que a derrocada do império passa a acontecer a partir de 1750, quando há uma divisão na monarquia de Oyó, acontecendo uma série de intrigas, tensões, até que Afonjá, até então o general das tropas de Oyó, organiza um golpe contra o reinado, tendo ajuda dos fulanis, hauçás e iorubás islamizados, além disso, Afonjá teria contado com a ajuda do fulani islâmico Alim Al-Sali, que deveria garantir a conversão dos derrotados, nesse golpe, há a separação da Ilorim, cidade sob o domínio do rebelde Afonjá, que se torna independente, com isso, outros estados vassalos passam a se rebelar. Em meio à esse processo, o Benin passa a atacar Oyó, que ainda contra-ataca mesmo enfraquecida devido aos golpes, posterior às revoltas de Ilorim. Em 1836 Afonjá é assassinado pelos Fulanis que instauram uma cidade islâmica em meio à iorubalândia, sendo governada então por um Emir, e não mais um Obá, ou Oní. Um fato interessante desse episódio é que Benin envia o brasileiro Francisco Félix de Sousa, o maior traficante de escravos e intimamente ligado ao povo Beni e posteriormente seria considerado um nobre da corte imperial de Benin, que teria a missão de realizar um acordo de paz entre os dois povos, falha a tentativa, Oyó cai e os dahomeanos continuam os ataques aos Oyó, recolhendo escravos que iam direto para o Brasil, muitos pelas mãos de F.F. de Sousa. Os remanescentes de Oyó ainda se mudam para a cidade militar de Ibadan, construída após a queda da capital de Oyó, Oyó-Ilê, construindo fortificações, que sucumbem aos seguidos ataques e dessa vez, contando com ataques europeus por mão-de-obra escrava.
Em 1888, Oyó se torna protetorado inglês, e em 1896 perde qualquer autoridade e autonomia. Vale ressaltar que todas essas guerras ainda acontecem em paralelo à invasão europeia, onde há a influência do europeu na manutenção dessas guerras.
REINO DO BENIN - DAHOMÉ
O reino do Benin, ocupado pelos Benis, não era muito diferente da iorubalândia, tinha uma cultura de ouro e prata muito forte, comercializava escravos no período do tráfico negreiro e tinha uma cultura militar muito forte, enfrentando tribos que ameaçavam os territórios do reino e claro, sempre nas tensões com o império de Oyó.
O reino do Benin também tem uma fundação mítica, se confundindo, já desde a origem, com uma lenda envolvendo a fundação de Oyó. Muito se diz que o filho da Orixá Oduduwa, Oranyan havia fundado Oyó, e seu filho, Eweká, teria sido o primeiro Obá de Benin, o primeiro rei. Os contatos com os europeus datam do século XVI, onde desde aí, os lusos passam a retirar e comercializar escravos do reino, que provocava guerras com as tribos dos arredores pra vender e estreitar laços com Portugal.
A ligação com a Brasil vem, justamente, da manutenção do tráfico negreiro, além disso, os Obá de Benin estreitaram relações com os portugueses, permitindo construções de igrejas e conversões, porém, a religião europeia não vinga e velhos costumes se seguem. Evaré, O Grande, teria sido o Obá que recebeu os portugueses e iniciou as primeiras trocas comerciais, inicialmente de cobre e algodão, seu sucessor, Esigi teria permitido o ingresso da igreja, onde nem ele mesmo se converteu ao cristianismo.
Os benis, seja por orgulho ou ódio, passaram a comercializar a mão-de-obra iorubá, vendendo diretamente aos portugueses e brasileiros, onde há uma certa autonomia garantida do Estado por conta disso.
Sua queda se dá por conta do domínio inglês no século XVIII no ano de 1896, quando os britânicos bombardeiam a capital do reino, Cidade de Benin, e tomam a posse da região. Os contatos com os ingleses se davam desde 1553, porém, as lideranças do reino passaram a desconfiar, cortando alguns laços comerciais. Dessa relação, é interessante levantar o ponto do príncipe do Benin que venho ao Brasil com sua corte.
OSUANLELE OKIZI ERUPÊ - CUSTÓDIO JOAQUIM DE ALMEIDA, PRÍNCIPE DE AJUDÁ ( 1832-1935 )
Príncipe Custódio é uma figura importante para a história do Rio Grande do Sul, ele teria vindo ao Brasil depois de um acordo com os invasores ingleses que o exilaram em solo brasileiro em 1864. Teria desembarcado na Bahia inicialmente e, curiosamente, o príncipe era também um Babalaô ( adivinho ), usando o jogo de Ifá, ele teria consultado os Orixás para saber onde deveria se instalar, ficou um tempo na Bahia, mas passou a viver no Rio de Janeiro, ficando alguns meses por lá, o príncipe consultou novamente Ifá e a partir daí se instalou no Sul do país, primeiramente em Rio Grande, e posteriormente em Porto Alegre. Teria vivido no bairro da Cidade Baixa, antiga Ilhota e lá, também teria sido foco de resistência de africanos e afro-brasileiros resididos em Porto Alegre. O príncipe tinha muito prestígio com as camadas populares, era amigo de Borges de Medeiros, célebre político gaúcho, e em sua casa realizava cerimônias de Batuque, um hábito mantido até hoje no RS pelos praticantes, já que na época havia perseguição aos cultos, os sacerdotes tinham o costume de realizar cerimônias fechadas e em suas próprias residências.
A principal ligação com o povo gaúcho desse príncipe é justamente na popularização e fundamentação do Batuque Gaúcho, ou, dos cultos de Nação.
As Nações no RS funcionam remontando um pouco características de antigos reinos africanos, são eles: Oyó, Jeje, Ijexá, Cabinda e Nagô. As nações passaram a ganhar notoriedade no pós-abolição e em outras regiões do Estado como Pelotas e Rio Grande, atualmente a região metropolitana concentra o maior número de casas religiosas.
Existe uma lenda em que se diz que o príncipe Custódio teria assentado um Bará de guarda no centro do Mercado Público de Porto Alegre, para proteger a cidade, ainda se diz entre os adeptos de que foram 7 assentamentos de Barás, muitos deles mantidos em sigilo até hoje, por isso não sabemos a exatidão e há muitas lendas sobre.
O RS ainda pode contar com a presença de mais de 70.000 casas de religião de matriz africana no Estado. Custódio também chamava a atenção por ser um monarca africano e atender, como curandeiro, desde a elite até as camadas mais pobres, como os ex-escravizados, se tornando um símbolo preto da capital gaúcha.
Foto de Custódio, domínio público, anos 1900.
Por: Vítor Matheus Gonçalves
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