OS ÍNDIOS DO SUL, OS BÁRBAROS PAMPEANOS

Pouco se comenta sobre a ligação do Rio Grande do Sul com os índios que habitaram as regiões pampeanas para além da ocupação corijó, kaigang e guarani. Todas as três etnias tinham costumes parecidos envolvendo a sedentarização, agricultura, além do caráter mais expansionista no que diz respeito à ocupação de terras para plantio e a cultura baseada no cultivo e consumo igualitário entre os membros das tribos. Porém, pouco se falam sobre etnias como os Charruas e Minuanos que ocuparam os pampas sul-riograndense brasileiros além do Uruguai e Argentina, ainda teríamos a presença dos Yaros, Mbohanes e Guenoas que dividiram espaço com os Charruas e os Minuanos.


VIDA NOS PAMPAS

Os Charruas tinham uma alimentação na base da caça e eram semi-sedentários, se instalando em determinadas localidades conforme as estações, além de levarem consigo os " toldos " feitos de pele animal na qual eram, de fato, toldos onde abrigavam mantimentos e a si próprios. Além disso, eram extremamente guerreiros, o que espanta os europeus nos primeiros contatos, os demonizando em seguida. Não se tem muitas informações sobre o idioma Charrua, já que não seguiram o caminho dos Minuanos, que se uniram inicialmente aos portugueses firmando acordos, os charruas eram esquecidos propositalmente pelos europeus, já que passariam a incomodar o andamento dos objetivos dos espanhóis e portugueses nas regiões, principalmente no período da formação dos Estados nacionais do Uruguai e da Argentina.

RELAÇÃO COM OS EUROPEUS

A partir do século XVI, rebanhos bovinos foram introduzidos no Sul do Brasil, Uruguai e Argentina, o que causa um impacto forte na cultura charrua naquele contexto, uma vez que a caça era a prática fundamental para além da guerra, os indígenas pampeanos passaram a caçar o gado e a roubar dos latifundiários, gerando a ira não só dos grandes produtores, mas também dos jesuítas que tinham rebanhos nas reduções/missões jesuítas. Mas não só isso alteraria os costumes dos indígenas, a introdução do cavalo fariam deles verdadeiros guerreiros indomáveis. Aqui cabe ressaltar que os charruas tinham uma cultura animista, ligada à natureza, ao xamanismo, acreditando que os homens e os de mais seres tinham ligações espirituais exercendo espécies de comunicação em comunhão à natureza, ou seja, eles tinham uma cultura sustentável no que tange ao uso da natureza para sua sobrevivência.
Com essas tensões, os Charruas foram alvos de expedições de caça, ofereciam boas quantias por orelhas e testículos arrancados dos charruas, comprovando sua eliminação. Jesuítas formavam brigadas guaraníticas afim de eliminar as ameaças às reduções, além de latifundiários contratarem os gaúchos ( equivalentes aos bandeirantes ) para caçarem os charruas, algo muito parecido com a relação dos Bandeirantes com as etnias tupi.
A situação era complicada tanto que os charruas se viram obrigados a firmar parcerias com os minuanos resistentes aos portugueses e espanhóis, mas mesmo assim não foi o suficiente, os índios foram barbarizados por inúmeras vezes até sucumbirem.

CHARRUAS X GUARANIS

Existia uma certa rixa entre charruas e guaranis, ambos coletavam e caçavam, além de os charruas, em determinados momentos, adentrarem regiões ocupadas por guaranis, havendo confrontos e como ambos os povos eram aguerridos, ninguém fugia. A honra entre os índios sempre foi marca reconhecida tanto entre os índios quanto para com os europeus.
Nesse contexto, é bom enfatizar a questão do líder guarani Sepé Ti Arajú, que aculturado pelos jesuítas espanhóis, servia a eles com lealdade, liderando milícias guaranis na contenção dos avanços charruas e eventualmente minuanos. Sepé se tornaria um símbolo nacional quando que, em 1753, eclodem as Guerras Guaraníticas onde jesuítas armam os guaranis e enfrentam as coroas espanholas e portuguesas, mas voltemos ao foco.
Essas milícias vão aumentar o teor da rivalidade entre as duas nações que já se enfrentavam em outros momentos da história ameríndia.

ETNOCÍDIO CHARRUA

Para além das milícias organizadas por guaranis convertidos, espanhóis e portugueses latifundiários, os charruas foram de pouco a pouco sendo dizimados. Mas ainda assim, já com a ocupação espanhola no Uruguai e no período entre os séculos XVIII e XIX, muitos conflitos ocorriam. Um dos episódios que marcaram foi o ataque à redução de Jupeju, no noroeste rio-grandense em 1701, em represália, os colonos seguiram os índios pelas matas e os emboscaram, matando em torno de 500 charruas só nesse ataque. Os charruas ainda seriam peças importantes no processo de independência do Uruguai, mas foram covardemente traídos e dizimados pelas tropas uruguaias à mando de General Fructuoso Rivera.
O Uruguai por muito tempo escondeu documentos envolvendo massacres, fotos de corpos e detalhes de milícias contra os charruas, no século XIX, as mulheres e crianças que restaram passaram a trabalhar em casas das elites argentinas e uruguaias.



OS ÚLTIMOS CHARRUAS, TRISTE FIM NA FRANÇA

Tacuabé, Guyunusa, Senaqué e o cacique Vaimaca Perú foram os " últimos charruas ". Três homens e uma mulher grávida foram enviados para a França, e expostos em Paris num zoológico tal qual animais eram expostos. De pouco a pouco foram falecendo, Guyunusa ainda teve um bebê em meio à uma exposição onde, como se conta na historiografia uruguaia, franceses no local disseram algo como: " vejam, se parece com os nossos ", denotando o caráter animal no qual foram estigmatizados os charruas. Senaqué foi o primeiro a falecer, era um pajé, diz-se que faleceu de fome, Vaimaca já era um velho cacique e sucumbiu à doença e diz-se até que a loucura, já que há lendas de que ele se imaginava andando à cavalo dentro de sua cela, Guyunusa acabou falecendo por doenças e Tacuabé, o mais novo, um guerreiro, sobreviveu e conseguiu fugir com o bebê do local, há o mito de que Tacuabé prometeu que a criança cresceria livre e forte, não se sabe de seu paradeiro posteriormente a isso.


CULTURA ASSIMILADA

A cultura charrua é presente ainda hoje entre os uruguaios, argentinos e os gaúchos brasileiros, uma vez que o chimarrão, o churrasco de espeto de madeira e fogo de chão, o pala, o chiripá, lenço a boleadeira usada para caçar em longas distâncias e etc. Parte dessa indumentária seria assimilada aos gaúchos depois da extinção da nação charrua.
Hoje muito se é usado em menção a esses índios indomáveis, mas pouco se é honrado em sua memória, mais um episódio indigesto e triste da história brasileira e americana.
Homens e mulheres honrados que não cederam à ocupação espanhola e portuguesa mas que, inevitavelmente sucumbiram não só pela mão européia, mas também por etnias indígenas aliadas aos mesmos.
Atualmente há uma comunidade charrua no RS, e em outros países como o próprio Uruguai. 


Por: Vítor Matheus Gonçalves

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